quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Sí Se Puede Tour 2008 // Capítulo 9: Rua sem saída

Nada melhor que sair de Bariloche e ouvir que as pistas de esqui tinham sido abertas na manhã em que partimos. Nada melhor. Mas enfim, era hora de tomar o rumo de casa. Seguimos em direção a cidade de Neuquén deixando para trás as montanhas nevadas e, mais uma vez, acompanhando o curso de um rio, desta vez o Limay. A estrada, praticamente deserta. Todos aqueles cenários que tínhamos acompanhado por quase 20 dias ficavam apenas nos retrovisores. Triste, muito triste.

Reta reta reta reeeeta. Nenhuma curva

Passamos por Neuquén buscando notícias da Eurocopa e principalmente do mui-querido Racing, tentando escapar do rebaixamento no torneio local. Após algumas estradas incertas, chegamos a localidade de Choele Choel, onde iniciamos um incrível trecho de 133km de pura reta. Tão reto que um carro com geometria perfeita poderia cruzá-la sem motorista. Tão reto que se os condutores do veículo tivessem saído na noite anterior, teriam muito sono. E se fosse à noite, pior ainda. (E não foi assim?)

-Vai uma pane seca aí? -Não, prefiro conhecer Lanús

Já passávamos de Bahia Blanca quando o receio de uma pane seca nos fez retornar 40km até um local seguro para abastecer. Não esqueçam que combustível na Argentina é algo parecido como água no Saara (Ok, exagerei. Mas é por aí). Obrigado, Otávio. Não satisfeitos com essa perda de tempo, nosso navegador achou uma boa idéia entrar em Buenos Aires por Lanús e Banfield. Sob intensa neblina e ouvindo na rádio que a temperatura baixara em Bariloche (ódio), chegamos no hotel quando amanhecia, umas duas horas depois do previsto graças aos engarrafamentos suburbanos. Obrigado, Maurício.

Paiê, falta muito?

Buenos Aires é aquela coisa. Pubzinhos, cervejinha, restaurantezinhos, noitezinha... Opa! Noitezinha não teve. Prova de que segunda-feira é igual em qualquer lugar do mundo. Porém, tudo compensado com o Kansas. Só aqui você pode estar bêbado e comendo um belo naco de carne numa segunda-feira às 4 da tarde. I love this game. Mais um dia e o trecho final. Balsa até Colônia, mais uma carnezinha em Montevideo com final do campeonato uruguaio numa quarta-feira a tarde, e dê-lhe estrada. Eram quase 1h da manhã de quinta-feira quando o trajeto todo encerrou-se.

8.095km que valeram cada centímetro. Agradeço aos meus amigos que compartilharam isso comigo. Sem dúvida, algo para nunca mais esquecer. [Ok, momento clichê, eu sei. Mas foi necessário]

Mission acomplished. De volta à vida real.

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Sí Se Puede Tour 2008 // Capítulo 8: Nós (e o Brasil inteiro) em BARILÓXI

Depois de mais de 10 dias viajando, vendo cenários impressionantes, porém quase sem o gostinho da vida noturna, nossa estadia em Bariloche era tida como a redenção festeira, tanto que para isso reservamos 4 dias na cidade. Logo na primeira noite, problemas: o quarto dito como triplo era, na verdade, um duplo com cama adicional. Além da distância de menos de 20cm entre uma cama e outra, o espaço era tão reduzido que as malas tiveram que ser alocadas em cima da televisão. Na manhã seguinte, nossas reclamações foram atendidas graças ao nosso amigo pseudo-portenho, com sotaque bonairense, que confundiu até o recepcionista do hotel - "Los brasileños son insoportables", disse ele, sem perceber sua origem. Ao final, trocamos para um quarto decente.

Para remover manchas de vinho, clorofila e detergente de cozinha

Logo no primeiro dia, começamos a perceber nosso maior erro de planejamento na viagem. Apesar de estarmos em pleno Junho, Bariloche recém estava prestes a iniciar sua média temporada, ou seja, a maioria das atrações turísticas estava fechada. A começar pelo Cerro Catedral, maior estação de esqui da América Latina, que não possuía a quantidade mínima de neve para abrir suas pistas. O clima, chuvoso, piorava a situação. Nos restou devorar um cordeiro patagônico, comprar umas garrafas de vinho e assistir a Eurocopa no hotel - que não ofereceu saca-rolhas. Azar o deles: a tática de empurrar a rolha fez espirrar vinho nas colchas, cortinas e até no teto.

Wilkenny: pub irlandês com funk carioca

Com o jogo entre Brasil e Argentina pelas eliminatórias, buscamos um local agradável (= sem brasileiros) para assistir ao confronto. Dureza. Local repleto de brasileiros. Sim, haviam alguns argentinos, mas eram minoria. Passada a quase derrota, as mesas foram movimentadas e inicou-se uma pachanga, porém 20min depois "um tapinha não dói" era o som que agitava o lugar. Não, eu não havia andado 6000km pra ouvir funk. Era ruim demais pra ser verdade...

Amor não correspondido

A manhã seguinte começou com uma ótima notícia: neve. Apesar disso, as pistas de esqui permaneciam fechadas. Nos restou seguir o roteiro original e conhecer as vizinhas Villa La Angostura e San Martín de Los Andes. Apesar da neve, a estrada estava aberta, sem necessidade de utilização de correntes. O cuidado redobrado não apenas pela pista escorregadia, mas também pela pouca visibilidade. Villa La Angostura é um vilarejo pequeno, distante 100km de Bariloche, sem maiores atrativos. Dali, parte um barco que cruza o Lago Nahuel Huapi até Bariloche, mas este não estava funcionando por problemas no licenciamento das empresas. Dali, mais 150km - parte em estrada de terra - até San Martín.

O rio nos guia

A estrada em péssimas condições era quase desapercebida devido a beleza da região. Contornando diversos lagos, rios e cascatas, a estrada cruza o Parque Nacional Los Arrayanes. Talvez aqui tenha sido o único trecho onde sentimos falta daquela caminhonete 4x4, tão endeusada por aventureiros. Contudo, o Civic cumpriu seu papel. San Martín fica encravado entre as montanhas, costeado pelo Lago Lacar. Uma cidadezinha com jeitinho alemão, ruas e construções simpáticas e - o mais importante - livre de brasileiros. 5km distante está o Cerro Chapelco, outra importante estação de esqui, também fechada na ocasião. O dia caía quando um erro na visualização do mapa nos faz ter que andar 250km de volta. No caminho, precipitação intensa de neve. Infelizmente, a noite não nos permitiu ver mais uma estrada fantástica que apenas as luzes do carro tentavam nos mostrar.

Photoshop? Parece mas não é

Conclusão do grupo: San Martín põe Bariloche no bolso. Aqui sim, é possível conhecer uma cidade autêntica, encantadora e com atrativos de lazer. Talvez tenhamos conhecido Bariloche numa época ruim, mas a impressão que tivemos é que a cidade é uma "Tramandaí dos Andes". Tudo muito turístico, muito forçado, nada original. Pior ainda com as pistas de esqui fechadas, o que nos obrigou a circular bastante pelo centro da cidade. Seguidamente, fomos assediados por vendedores de blusões, mantas e toucas que apenas pelo olhar identificam a procedência de todos e emendam um "português acastelhanado".

Bad Otávio

Após algumas noites de funk e reggaeton no tal Wilkenny, ouvindo muitos brasileiros elogiando Barilóxi, nossa estadia em Brasiloche chegava ao fim com um passeio ao Cerro Otto e sua confeitaria giratória, no topo da montanha, de maneira melancólica. Bariloche não foi nada do que esperávamos. Além disso, a nossa aventura se aproximava do fim. Um pit-stop em Buenos Aires e, logo, estaríamos em casa.

Um dia, tudo acaba.

domingo, 3 de agosto de 2008

Sí Se Puede Tour 2008 // Capítulo 7: Mais um dia daqueles

O dia começou cedo aquela terça-feira em Puerto Varas. Aliás, cedo demais. Quando acordamos, às 7h30, ainda era noite fechada. O Sol só deu as caras por volta das 9h. Nossa tarefa era retornar à Argentina, em direção a San Carlos de Bariloche. Não exatamente um cruze, pois Bariloche está situada na Cordilheira, numa parte mais baixa, com altitude próxima a 1500m sobre o nível do mar. O caminho mais curto é retornar direto a Osorno e seguir na direção leste. Porém, os vulcões nos chamavam do outro lado do lago Llanquihue, e resolvemos contorná-lo.

Visual bem feio: vulcão Chabulco a esquerda e lago Llanquihue

Passados 50km, chegamos na entrada do Parque Nacional Vicente Perez Rosales. Vimos a entrada e pensamos "por que não entrar?". Seguimos por aproximadamente 10km dentro da mata fechada, até em seguida o cenário mudar: subidas íngrimes e o cume do vulcão Osorno. Subindo, subindo, subindo até a base do vulcão, onde se encontra uma estação de esqui. Talvez o visual mais impressionante da viagem. Estávamos sobre as nuvens, com todo o lago Llanquihue na nossa vista. O vulcão, tão próximo. Por lá ficamos alguns minutos, fotografando o local por absolutamente todos os ângulos.

Use freio motor

Descemos de volta e seguimos por uma estrada de terra mais 25km. Alguém viu algum problema? Não. Impossível. Costeando o lago, com casinhas no pé da montanha e vacas cruzando a estrada... Ah, quer saber? Olha a foto aí embaixo.

Alpes suíços? Não, região dos lagos chilenos

Passada a estrada de terra, retornamos até a cidade de Osorno, sempre observados pelo vulcão homônimo. De lá, seguimos em direção ao Paso Cardenal Samoré, fronteira Chile-Argentina. Na cidade de Entre Lagos, tínhamos a última oportunidade de fazer uma refeição digna. Apesar de ninguém ouvir a sugestão de irmos num lugar que tivesse muitos caminhões (sinal de comida honesta), resolvemos perguntar aos habitantes qual o melhor restaurante da cidade. Fomos encaminhados a um estabelecimento localizado na beira da estrada... com muitos caminhões estacionados ao lado. Lá, gastamos nossos últimos centavos chilenos - mais pela grana estar curta do que pela necessidade de livrar-se da moeda. Agradecemos a garçonete pelo "desconto" na conta e tocamos o barco.

Big Brother

A viagem seguia monótona até entrarmos no Parque Nacional Pueyhue. Dali, iniciamos um trajeto bem diferente do primeiro cruze, onde a região árida parecia mais um deserto. Ali, uma floresta, cascatas e lagos nos acompanhavam ladeira acima, rumo a Argentina. A aduana chilena, espertamente localizada na parte baixa da floresta, uns 20km distante da fronteira, ficara para trás. De repente, estávamos de novo com neve nas laterais da estrada. Atenção redobrada, pois poderia haver gelo na pista. Paramos para fotos na fronteira. Chamando a atenção pela placa brasileira, fomos abordados por um trio de cariocas que se dirigia a Osorno para comprar eletrônicos... (que diabos?!?). Comentamos sobre nossa viagem e mostramos as fotos feitas nas horas anteriores. Fizeram cara de que nem sabiam que aquilo existia. Negócio mesmo era ir pro Chile comprar eletrônicos (???). Nos planos deles, era possível ir a Osorno, voltar e ainda ir até San Martin de Los Andes, 150km distante de Bariloche. Ainda naquele dia. Considerando que eram 17h e a fronteira fechava às 20h. E que a estrada para San Martin é de terra. Boa sorte...

Esquerda, Argentina; direita, Chile

Enquanto a tarde caía, continuávamos em nossa viagem rumo a Bariloche. Ainda teríamos que contornar o lago Nahuel Huapi por aproximadamente 100km, e assim o fizemos. Continuamos a parar para fotos enquanto ainda havia luz do dia. Quando avistamos Bariloche do outro lado do lago, a noite já tinha caído e a cidade estava iluminada. Outro dia de cenários impressionantes havia terminado.

A viagem poderia terminar aí mesmo.